"Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da
vida para entrar na História”. A frase, uma das mais célebres passagens
da história política brasileira, encerra a carta-testamento deixada por
Getúlio Vargas. Há 60 anos, no dia 24 de agosto de 1954, o então
presidente tirou a própria vida em meio à pior crise enfrentada em seus
anos de atuação política.
Uma reunião com os ministros no Palácio
do Catete varou a madrugada e decidiu que Getúlio se afastaria do
governo por três meses para dar lugar ao vice, Café Filho. Após o fim da
discussão, já com o dia claro, o político se recolheu ao seu aposento.
Por volta das 8h35, o barulho de um tiro ecoou pelo palácio. Seu filho
Lutero correu para o quarto, seguido pela esposa de Vargas, Darcy, e a
filha Alzira.
"Getúlio estava deitado, com meio corpo para fora
da cama. No pijama listrado, em um buraco chamuscado de pólvora um pouco
abaixo e à direita do monograma GV, bem à altura do coração, borbulhava
uma mancha vermelha de sangue. O revólver Colt calibre 32, com cabo de
madrepérola, estava caído próximo à sua mão direita". É assim que o
biógrafo Lira Neto descreve o cenário da morte de Vargas no terceiro
volume da série Getúlio.
A carta-testamento de Getúlio Vargas,
que seria lida durante aquele dia pelas rádios em todo o território
nacional, foi encontrada em um envelope, encostada ao abajur da mesinha
da cabeceira da cama do então presidente. Nos apontamentos do biógrafo, o
texto, originalmente esboçado por Getúlio, teve sua versão final
passada na máquina de escrever pelas mãos de um amigo, José Soares
Maciel Filho, já que o ex-presidente não sabia datilografar. O rascunho
da carta havia sido encontrado no dia 13 de agosto pelo major-aviador
Hernani Fittipaldi, um dos ajudantes de ordem de Getúlio, enquanto
arrumava a mesa do presidente.
Assustado com o conteúdo do
manuscrito, ele entregou o papel à Alzira, que questionou o pai. “Não é o
que estás pensando, minha filha. Não te preocupes, foi um desabafo”, se
esquivou Vargas. Essa porém não foi a primeira vez que Getúlio fez
menção ao suicídio. Em suas anotações pessoais, ele já havia cogitado
tirar a vida em outros momentos de sua jornada política.
A
primeira delas foi quando chegou ao poder em 1930. Naquela data,
enquanto se encaminhava para a sede do governo, se disse disposto a não
retornar com vida ao Rio Grande do Sul caso não obtivesse sucesso na
empreitada. Era a primeira anotação pessoal que fazia no diário que
carregou para o resto da vida. Lira Neto considera que a diferença em
1954 é que Getúlio se viu encurralado e não conseguiu contornar a crise,
como das outras vezes.
Depois de chegar ao poder na liderança do
movimento que ficou conhecido como Revolução de 1930, o político gaúcho
Getúlio Dornelles Vargas exerceu o governo no país de forma
ininterrupta até 1945. De 1930 a 1934 ele foi chefe do governo
provisório. Em 1934 foi eleito presidente da República pela Assembleia
Nacional Constituinte e exerceu o Governo Constitucional até 1937,
quando, por meio de um golpe, instaurou a ditadura do Estado Novo, que
durou até 1945. Retirado do comando do país por um golpe militar, se
recolheu à cidade natal, São Borja (RS), de onde articulou a volta ao
poder pela via democrática nas eleições presidenciais de 1950, cujo
mandato não conseguiu completar.
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