Material
tóxico depositado em área da CBB pode ter causado contaminação que
atingiu mananciais de Belém e sul do Marajó.
Uma revelação, feita na última semana, aos promotores de Justiça do
Pará que acompanham o rumoroso caso de inúmeras toneladas de lixo tóxico
que foram despejadas no município de Ulianópolis, no sudeste do Pará,
pode esclarecer muitas questões relativas à autorização para a entrada
do material, altamente perigoso, em solo paraense, que deu origem ao
maior desastre ambiental da Amazônia. O empresário Pedro da Silva, preso
em São Paulo por agentes do Gaeco, em janeiro deste ano, fez revelações
bombásticas aos membros do Ministério Público paraense, liderados pelo
procurador de justiça Nelson Medrado, que viajaram até São Paulo para
colher, na prisão, a oitiva do empresário.
Para os promotores, Pedro Silva disse que sofreu muita pressão de
deputados paraenses e de políticos influentes para a não instalação da
usina de incineração no Pará. Ele narrou que chegou a pagar passagens e
propina a muitas pessoas, mas só conseguiu instalar a empresa em
Ulianópolis e obter a autorização para o transporte e armazenamento dos
resíduos tóxicos depois da interferência direta de Jader Barbalho e da
deputada federal Elcione Barbalho. O depoimento foi todo gravado e está
em poder da força tarefa criada pelo Ministério Público para apurar
todas as circunstâncias que levaram à entrada do material tóxico no
Pará. “Ele disse que está com muito medo e que teme ser morto”, disse o
procurador Nelson Medrado, em entrevista exclusiva ao jornal O LIBERAL,
ressaltando que o empresário afirma ter várias provas e documentos
comprometedores.
No depoimento de mais de duas horas, Pedro da Silva disse que tem
medo de voltar ao Pará e que teme por sua vida, uma vez que já sofreu um
atentado em São Paulo. Ele disse ainda aos promotores que tem muita
gente “graúda” envolvida no desastre ambiental de Ulianópolis e que tem
plena consciência de que o material depositado na área pode dizimar uma
população inteira, podendo causar a morte de milhares de pessoas.
Produto provocou morte em 2003
O acidente ambiental chamou A atenção de todo o Estado do Pará em
2003, quando o funcionário da empresa incineradora Companhia Brasileira
de Bauxita (CBB), Manoel Benedito dos Santos, morreu em circunstâncias
obscuras dentro do pátio da Uspam, na zona rural de Ulianópolis, após
manusear produtos químicos. Ele foi retirado da empresa e levado para um
hospital na cidade de Imperatriz, onde já chegou morto.
Depois de uma intensa batalha que envolveu moradores, autoridades
municipais, estaduais e ainda lideranças da sociedade civil do
município, a empresa CBB foi fechada em novembro de 2003. O gerente da
empresa fugiu da cidade e jamais foi localizado pela justiça. Na comarca
de Ulianópolis, tramitam várias ações contra a companhia. Anos depois, a
área onde funcionava a CBB foi leiloada para pagar dívidas
trabalhistas.
Entre os resíduos mais perigosos que ainda permanecem espalhados no
pátio da CBB, sendo inclusive retratados no programa Fantástico, da Rede
Globo, estão materiais de sobras de construção da Usina Angra II, no
Rio de Janeiro. Entre as empresas arroladas estão a Stolthaven Ltda,
Scarlat Comercial Ltda, Vopax Brasil S.A, Tintas Coral, Trimtec, Texaco,
Stoncor, Santista, Recofarma, Pepsi Cola, Internacional Paper do
Brasil, Hokko do Brasil, Granel Química, Grace Brasil, Camargo Corrêa,
Brasco Logística e Bic do Brasil, entre outras.
Em 2005, o professor universitário aposentado Paraguassú Éleres
ingressou no Tribunal de Justiça do Estado do Pará para propor, em rito
sumário, ação popular contra 26 empresas nacionais e multinacionais,
acusadas de despejar resíduos tóxicos dentro de uma área de terra
pertencente à empresa CBB. Na ação, ele pede que a justiça condene as
empresas a pagar a quantia de 50 milhões de reais para recompor e
recuperar toda a área contaminada pelos dejetos tóxicos.
E ressalta que “grande quantidade de resíduos industriais
naturalmente disseminaram-se por uma área de mais de 20 hectares”.
Conforme o material fotográfico anexado ao processo, os resíduos
contaminaram rios, uma vez que os dejetos possivelmente alcançaram a
margem direita do Rio Capim, que passa pelo município de São Domingos do
Capim, ponto de tributação do rio Guamá, e seguiram por locais onde
residem populações ribeirinhas, chegando, finalmente, ao município de
Belém, através do Rio Guamá e Baía do Guajará, onde ocorre a captação de
água para os lagos Bolonha e Água Preta, que abastecem a cidade.
“Cumpre-se ainda observar que, no refluxo das marés que adentram o
estuário tocantino, as águas necessariamente não retornam só ao Rio
Guamá, mas, nessa direção defluem para os rios Acará e Moju. Ou seja, a
poluição ambiental hídrica gerada pelos resíduos da CBB, iniciada na
microbacia de Ulianópolis, poderá ter se propagado até a parte sul da
Ilha do Marajó”, afirma o documento protocolado no TJE.
Finalizando a ação popular, o proponente solicita vistoria de campo
por técnicos do Ibama e da Universidade Federal do Pará e que se proceda
inspeção judicial, acompanhada por agentes da Polícia Federal,
requisitando helicópteros da Força Aérea Brasileira, sediados na base de
Val-de-Cans, e ainda que ‘condene os diretores das empresas rés às
penas de reclusão cabíveis, conforme a gravidade de cada caso.
MP processou 17 empresas em 2015
No ano passado, o Ministério Público do Pará, por meio da Promotoria
de Justiça de Ulianópolis e do grupo de trabalho institucional criado
para atuar na questão da poluição ambiental em área daquele município,
ajuizou denúncias criminais pela prática de crimes ambientais
normatizados pela lei 9.605/98, contra 17 empresas e seus dirigentes. O
MP não forneceu os nomes das empresas processadas, todas grandes
multinacionais com atuação no Brasil.
Todos foram responsabilizados pela infração ambiental relacionada à
deposição de resíduos e rejeitos oriundos de produtos tóxicos, perigosos
ou de destinação especial, em área integrante do município, em
desacordo com a legislação ambiental vigente e causando grave dano
ambiental, de difícil reparação, com o comprometimento de solo e água,
bem como com graves repercussões à saúde humana e à sadia qualidade de
vida, afetando a vida econômica e social da comunidade local.
As denúncias foram assinadas pelos promotores de justiça Arthur Diniz
Ferreira de Melo, titular da promotoria de Justiça de Ulianópolis, e
pelos promotores de Justiça integrantes do Grupo de Trabalho Remediação,
Louise Rejane de Araújo Silva, Maria Cláudia Vitorino Gadelha, Brenda
Correa Lima Ayan, Sabrina Daibes Sanches, Marcio Silva Maués de Faria,
Nilton Gurjão, do Centro de Apoio Operacional de Meio Ambiente (Caoma),
José Godofredo, promotor auxiliar do Caoma, e pelo procurador de
Justiça, Nelson Medrado.
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